Especialistas explicam que símbolos da juventude mudam ao longo da história e criam ilusão de que as pessoas no passado pareciam mais velhas.
Já teve a experiência de olhar fotos antigas dos seus pais ou dos seus avós na juventude e ficar com a impressão de que eles pareciam mais velhos? Nos últimos dias, o assunto tomou as redes com um vídeo viral que mostra um programa de auditório da TV nos anos 1980 com pessoas contando suas idades, mas que a internet pareceu não acreditar.
Será que no passado, as pessoas pareciam mesmo mais velhas? Apesar de alguns hábitos terem mudado, como redução no número de fumantes, menos trabalhos expostos ao sol e mais consciência sobre a qualidade da alimentação, não há evidência científica que demonstre que quem tinha 20 anos no passado tenha uma aparência diferente de quem tem 20 anos hoje.
O que especialistas explicam é que isso é uma ilusão.
Faça um teste:
A jovem na imagem acima conta no vídeo que tem 19 anos. Ela traz no visual símbolos dos anos 80: o cabelo com “permanente”, uma técnica que deixava os cabelos cacheados, bem volumosos. Além do corte, os brincos.
Agora, tente imaginar: pense na mesma mulher, mas com um corte de cabelo mais atual, um brinco mais moderno, uma maquiagem mais contemporânea e chamativa.
Provavelmente, você vai conseguir enxergá-la mais jovem. É como acontece em programas de transformação, nos quais a mudança no estilo faz a pessoa parecer ter alguns anos a menos.
Para Jussara Romão, especialista em moda e autora do livro que aborda a trajetória dos últimos 100 anos da moda no país, a imagem da juventude está ligada a símbolos: as roupas, os cabelos, os acessórios e a forma de se comportar. E esses símbolos não são permanentes.
Ou seja, as pessoas no vídeo, seus pais e seus avós não pareciam, de fato, mais velhos. É que quem vê a imagem tem uma ideia diferente do que é jovem. É como uma "ilusão de ótica".
Jussara explica que, nos anos 80, o estilo era mais sóbrio e imprimia a ideia de respeito, o que fazia com que as pessoas jovens passassem a imagem de mais maduras.
Nas imagens, a gente vê mangas bufantes, homens de camisa aberta com peito exposto, o permanente nos cabelos. Esses são símbolos do que tinha de mais moderno na época. Ou seja, eles têm, sim, a idade que dizem ter. O que ocorre é que essa imagem não é a imagem que nós temos do que é jovem e cria essa ilusão.
A especialista ainda cita a postura sóbria das pessoas, que é diferente da que vemos em jovens atualmente, mais conectados ao entretenimento das redes sociais. Isso também ajuda a dar a falsa impressão de que a pessoa no vídeo é mais madura.
A mudança na visão da juventude
A especialista em doenças da beleza Joana Novaes explica que, para além dos símbolos, a visão sobre a juventude tem a ver com o comportamento atual: há uma valorização maior sobre ser jovem, que é considerado um valor.
Vivemos em uma sociedade de consumo, que aclama a performance. Com isso, a juventude é um atributo até profissional. Por isso, as pessoas têm buscado parecer cada vez mais novas, seja com as roupas, com comportamentos e até procedimentos estéticos.
Joana ainda reforça que a distorção da imagem, com o uso de filtros, ferramentas de manipulação de imagem nas redes e os inúmeros procedimentos estéticos são riscos à saúde mental. Para ela, a forma como enxergamos a juventude hoje é o gatilho que deixa tantas pessoas vulneráveis aos transtornos de imagem.
“Quando isso se torna um valor moral, você precisa se sacrificar para ser o mais jovem o maior tempo possível”, explica.
Cuidado com o que você diz nas redes, isso pode ser etarista
"Ah, mas você não parece ter essa idade" ou "nossa, parece mais velha" são frases que expõem o estigma da velhice, resumindo a primeira impressão de uma pessoa em sua idade. Isso é etarista.
Artistas como Andreia Beltrão têm falado sobre isso nas redes: por que ouvir que não parece ter a idade que tem é considerado elogio? E por que não se pode ter a idade que tem? Aos 58 anos, Beltrão chama à reflexão do quanto etarista isso pode ser.
Naira Dutra Lemos, presidente do departamento de gerontologia da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia, reforça que o apontamento da idade, seja para achar que a aparência é mais velha (como no vídeo) ou mais jovem, como no caso de Andreia, é um comportamento etarista.
Isso reforça o estigma de envelhecer. A pessoa se sente forçada a imprimir uma juventude que não tem e ainda é colocada sobre o julgamento das demais, que podem dar a ela mais ou menos idade. Por que não podemos ter a nossa idade?
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